5 de mai. de 2013

Polícia Civil: só 16% dos crimes são investigados



Polícia Civil: só 16% dos crimes são investigados

iG Paulista - 04/05/2013 22h06
Luciana Félix | IGPAULISTA@rac.com.br
Foto: Leandro Ferreira/AAN

O delegado da Dise de Campinas, Osvaldo Diez Júnior, com inquéritos abertos e em fase de investigação: delegacia fez a maioria das prisões


Do total de ocorrências registradas nos distritos policiais e nas delegacias especializadas de Campinas, apenas 16,7% viram inquérito policial e são investigadas. No primeiro trimestre deste ano, foram 12.125 ocorrências — entre elas, casos graves como roubo, latrocínio, homicídio e roubo a banco, e também os de menos periculosidade, como lesão corporal e furtos. Porém, no mesmo período, foram instaurados 2.028 inquéritos para investigação de crimes. Os dados são da Secretaria de Estado da Segurança Pública (SSP), que começou a divulgar na última semana os números da produtividade policial do município.

Só os crimes considerados violentos somaram 9.847 casos na cidade. Ou seja, se for considerado que os cerca de 2 mil inquéritos foram abertos para investigar crimes onde houve risco à vida, ainda sobram mais de 7 mil do mesmo tipo sem apuração. E, com isso, consequentemente, sem punição.

Esse índice de instauração de inquérito apresentado no município chama a atenção e é considerado muito baixo por especialistas consultados pela reportagem. Segundo o presidente do Sindicato dos Policiais Civis da Região de Campinas (Sinpol), Aparecido Lima de Carvalho, o número reflete a crise na estrutura da Polícia Civil, que apresenta hoje um déficit de, ao menos, 335 policiais.

A falta de funcionários na corporação e de estrutura da Polícia Civil já foi tema recente de reportagens do Correio Popular. Uma delas, publicada no dia 24 de julho de 2012, apontava que nos últimos cinco anos apenas 45 policiais civis foram contratados para trabalhar nas cinco cidades que pertencem à Delegacia Seccional de Campinas (além da sede, Indaiatuba, Paulínia, Valinhos e Vinhedo). No mesmo período, 90 policiais deixaram seus cargos por aposentadoria, falecimento ou demissão voluntária.

Bola de neve

Carvalho, que também é presidente da Federação Interestadual dos Trabalhadores Civis da Região Sudeste (Feipol), afirma que muitas ocorrências não se tornam inquérito porque não há mão de obra suficiente para o trabalho. “A falta de policiais inibe a investigação e, com isso, o crime não é apurado. Se o crime não é investigado como se deve, quem sofre é a sociedade. A falta de estrutura e de mão de obra na Polícia Civil é uma bola de neve que tem crescido muito nos últimos anos e agora está se tornando uma avalanche. Quem está pagando são as pessoas, e com a vida”, afirmou.

Ele afirmou que, atualmente a cidade possui cerca de 490 policiais na corporação e a função que menos possui funcionários são os escrivães — um dos principais encarregados pela instauração de um inquérito. “A defasagem é muito grande e chega a ser assustadora. O correto seria um escrivão para cada 200 inquéritos. Hoje, a realidade de Campinas é de um escrivão que cuida de 500 a mil inquéritos. É humanamente impossível. Com isso, eles vivem respondendo por omissão, o que é um absurdo”, disse. “Está tendo concursos, mas a quantidade não é suficiente porque o problema não é só de Campinas. É no Estado todo. É lamentável que, para o governo, não exista segurança pública”, reclamou.

Para o coordenador do Núcleo de Estudos, Pesquisas e Extensão sobre Situações de Violência e Políticas Alternativas (Nueva) da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), José dos Reis Santos Filho, a falta de apuração pelo pequeno número de inquéritos abertos reflete diretamente na impunidade e no aumento dos índices criminais.
“Os números de criminalidade de Campinas já são relevantes e a falta de um aprofundamento nisso acaba refletindo em dificuldade e isso gera falhas na prevenção. É preciso avaliar e saber o motivo de ser tão baixo o índice de apuração”, afirmou o professor.

“São muitos crimes violentos que sobram e que não são abertos inquéritos. Sem esse dado, fica muito difícil traçar um perfil. A questão é: qual foi critério usado para abrir 2 mil inquéritos? Que julgamento de valor foi utilizado para aplicar? É muito estranho”, disse.

Polícia Civil

A reportagem entrou em contato com o delegado Seccional de Campinas, José Carneiro Campos Rolim Neto, por telefone, na quinta-feira, e foi informada que ele estava em São Paulo para um curso.

A assessoria de imprensa da Secretaria de Estado da Segurança Pública informou, em nota oficial, que o delegado seccional de Campinas afirma que “nem todos os boletins de ocorrência geram inquéritos policiais e que esses casos são remetidos aos setores de investigação da polícia, em delegacias especializadas ou territoriais, para que a autoria dos crimes seja investigada”.

Durante a visita à cidade, no último mês de abril para a criação do Gabinete de Segurança, o secretário de Estado da Segurança Pública, Fernando Grella Vieira, afirmou que novos policiais civis que estão em treinamento serão remanejados para a cidade, mas não informou o número exato.