Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/56209-pela-extincao-da-pm.shtml Acesso em: 25.07.2012
Vladimir
Safatle
Pela
extinção da PM
No final do
mês de maio, o Conselho de Direitos Humanos da ONU sugeriu a pura e simples
extinção da Polícia Militar no Brasil. Para vários membros do conselho (como
Dinamarca, Espanha e Coreia do Sul), estava claro que a própria existência de
uma polícia militar era uma aberração só explicável pela dificuldade crônica do
Brasil de livrar-se das amarras institucionais produzidas pela ditadura.
No resto do
mundo, uma polícia militar é, normalmente, a corporação que exerce a função de
polícia no interior das Forças Armadas. Nesse sentido, seu espaço de ação
costuma restringir-se às instalações militares, aos prédios públicos e aos seus
membros.
Apenas em
situações de guerra e exceção, a Polícia Militar pode ampliar o escopo de sua
atuação para fora dos quartéis e da segurança de prédios públicos.
No Brasil,
principalmente depois da ditadura militar, a Polícia Militar paulatinamente
consolidou sua posição de responsável pela completa extensão do policiamento
urbano. Com isso, as portas estavam abertas para impor, à política de segurança
interna, uma lógica militar.
Assim,
quando a sociedade acorda periodicamente e se descobre vítima de violência da
polícia em ações de mediação de conflitos sociais (como em Pinheirinho, na
cracolândia ou na USP) e em ações triviais de policiamento, de nada adianta
pedir melhor "formação" da Polícia Militar.
Dentro da
lógica militar, as ações são plenamente justificadas. O único detalhe é que a
população não equivale a um inimigo externo.
Isto talvez
explique por que, segundo pesquisa divulgada pelo Ipea, 62% dos entrevistados
afirmaram não confiar ou confiar pouco na Polícia Militar. Da mesma forma,
51,5% dos entrevistados afirmaram que as abordagens de PMs são desrespeitosas e
inadequadas.
Como se não
bastasse, essa Folha mostrou no domingo que, em cinco anos, a Polícia Militar
de São Paulo matou nove vezes mais do que toda a polícia norte-americana
("PM de SP mata mais que a polícia dos EUA", "Cotidiano").
Ou seja,
temos uma polícia que mata de maneira assustadora, que age de maneira
truculenta e, mesmo assim (ou melhor, por isso mesmo), não é capaz de dar
sensação de segurança à maioria da população.
É fato que
há aqueles que não querem ouvir falar de extinção da PM por acreditar que a
insegurança social pode ser diminuída com manifestações teatrais de força.
São pessoas
que não se sentem tocadas com o fato de nossa polícia torturar mais do que se
torturava na ditadura militar. Tais pessoas continuarão a aplaudir todas as
vezes em que a polícia brandir histericamente seu porrete. Até o dia em que o
porrete acertar seus filhos.
VLADIMIR
SAFATLE escreve às quartas-feiras nesta coluna.