Disponível em: http://ultimosegundo.ig.com.br/colunistas/paulamiraglia/divisao+de+responsabilidades+sao+paulo+e+o+pcc/c1596943597605.html Acesso em: 10 maio 2011
Paula Miraglia
Antropóloga analisa segurança pública, justiça e cidadania
Relatório mostra que série de atentados de maio de 2006 vão além de achaque de policiais e revela problemas estruturais no Estado
10/05/2011 12:48
Foi lançado nesta semana o relatório São Paulo sob Achaque: Corrupção, Crime Organizado e Violência Institucional em Maio de 2006, um estudo sobre os ataques protagonizados pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) em maio de 2006 e suas consequências.
Na época, o PCC dirigiu uma série de ofensivas em pontos variados do Estado, resultando na morte de agentes públicos e execuções cuja responsabilidade é atribuída a policiais, apontadas como um revide aos ataques. As ocorrências revelaram o poder de um ator até então pouco conhecido e evidenciaram que São Paulo, ao contrário do que imaginava o senso comum e afirmava o Estado, também tinha grupos criminosos agindo de forma organizada.
Realizado pela ONG Justiça Global e a Clínica de Direitos Humanos da Faculdade de Direito de Harvard, o estudo vem a ser o primeiro esforço para entender em profundidade as circunstâncias envolvidas nos ataques e a suas conseqüências.
Ao questionar a responsabilidade e papel do Estado no episódio, o relatório aponta que maio de 2006 é apenas um momento de uma história longa e muito mais complexa, que envolve um sistema prisional absolutamente superlotado e que há muito tempo faz uso da violência e violação de direitos como estratégia de contenção. Mas, além disso, sublinha como a corrupção policial foi o verdadeiro combustível para o estopim da crise.
Em outras palavras, ao longo das mais de 250 páginas, temos um Raio X de uma política de segurança que pouco protege seus agentes, que tem baixa capacidade de controlar e regular a atividade policial e que, portanto, paradoxalmente, cria condições para o fortalecimento da organização criminosa – dentro e fora dos presídios.
Tal diagnóstico é extremamente relevante, sobretudo num momento onde o governo do Estado afirma que o PCC está enfraquecido, questionando até mesmo sua existência.
Mas a leitura do estudo frente ao contexto atual nos coloca a seguinte pergunta: o que realmente mudou? Os presídios em São Paulo seguem superlotados e com condições degradantes. Há hoje uma produção acadêmica consistente, mostrando como a gestão da violência nas periferias por parte do PCC contribuiu para a redução dos homicídios no Estado. Finalmente, as estatísticas criminais têm destacado São Paulo no que se refere às mortes causadas pela polícia.
Diante dessas constatações, além de uma análise importante dos episódios de 2006, o relatório é um bom mapa para entender o sistema de segurança publica em São Paulo e concluir que, ao invés de negar a realidade, uma estratégia bem sucedida deveria contemplar mudanças estruturais. Caso contrário, o futuro não será nada promissor.