Disponível em: http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/sp/2012-10-01/pm-paulista-matou-229-pessoas-no-primeiro-semestre-diz-ouvidor.html
Acesso em: 1 out. 2012
PM paulista
matou 229 pessoas no primeiro semestre, diz ouvidor
Levantamento
realizado pelo ouvidor Luiz Gonzaga Dantas revela crescimento na letalidade. No
ano passado, 438 pessoas morreram em confrontos com a polícia
Agência
Brasil | 01/10/2012 13:28:26
Confrontos
envolvendo a Polícia Militar (PM) de São Paulo provocaram a morte de 229
pessoas só no primeiro semestre deste ano. Os números foram passados pelo
ouvidor da Polícia do Estado de São Paulo, Luiz Gonzaga Dantas. Isso representa
crescimento, segundo ele, quando comparado a 2011, quando 438 pessoas morreram
em confrontos com a polícia durante todo o ano.
Somente os
confrontos envolvendo o 1º Batalhão de Choque da Polícia Militar, batizado como
Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota), vitimaram 48 pessoas no primeiro
semestre deste ano. “Se pegarmos um policiamento mais específico, no caso, a
Rota, há uma letalidade no semestre maior do que no ano passado. No ano passado
tivemos, nesse mesmo período , 40 pessoas que foram vitimadas pela Rota. No
primeiro semestre deste ano, tivemos um aumento de 20%, ou seja, 48 pessoas que
foram vitimadas pela Rota”, disse o ouvidor.
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também:
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Se forem
considerados também os meses de julho e de agosto, a letalidade em confrontos
envolvendo a Rota e registradas como “resistência seguida de morte” sobe para
65 casos. Para a ouvidoria, se for mantido o ritmo, “é possível que o número de
letalidade da Rota seja maior em 2012”. Os números de setembro ainda não foram
contabilizados, mas devem ser acrescentadas à lista as novemortes ocorridas em Várzea Paulista, na Grande São Paulo, onde 40 homens da
Rota entraram em confronto com um grupo de criminosos que julgava um homem
acusado por eles de estupro.
Desde
novembro do ano passado, a Rota esteve sob o comando do tenente-coronel
Salvador Modesto Madia, que foi substituído na última quarta-feira (26) pelo
tenente-coronel Nivaldo César Restivo. Ambos são réus no processo que envolve o
Massacre do Carandiru, ocorrido em 1992, quando 111 detentos foram mortos.
MARIO ÂNGELO/SIGMAPRESS/AE
Local onde agentes da Rota entraram em confronto com integrantes do PCC, em Várzea Paulista
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Em todo o
ano passado, confrontos envolvendo a Rota vitimaram 82 pessoas, mostrando
crescimento no número de mortos desde 2007, quando foram registrados 46 casos.
Desde 2001, o maior número de mortes envolvendo a Rota ocorreu em 2003, com 124
letalidades. Para o ouvidor, números mostram que é preciso ampliar o esforço
para que as mortes ocorridas em confrontos com a polícia deixem de ser
registradas como resistência seguida de morte e passem a ser consideradas
homicídios.
“Estamos
envidando esforços para que esse registro seja feito de acordo com a lei. Não é
nenhuma coisa do outro mundo. Vamos conversar com o Tribunal de Justiça e o
Ministério Público para que crimes onde há mortes e nos quais conste que a
pessoa resistiu a uma ordem legal do agente público de segurança sejam
registrados como homicídio”, disse Dantas.
Mudanças
Apesar de
os números apontarem crescimento no número de mortes, o perito aposentado do
Instituto de Criminalística de São Paulo, Osvaldo Negrini Neto, responsável
pelo laudo principal sobre a morte dos presos no Massacre do Carandiru, acha
que houve mudanças no comportamento da Rota desde aquela época.
“Eu
trabalhava em uma seção chamada de Perícias de Resistência Seguida de Morte.
Sabe quantos casos tínhamos por mês, naquela época? Duzentos e vinte. E a
maioria era [praticada pela] Rota. Hoje, com a população quase dobrada, não
chega a 50 por mês, na capital. Veja como mudou a conduta da Polícia Militar.
Ainda está violenta, mas na época você nem acreditaria”, disse ele.
Segundo o
perito, no mês seguinte ao massacre, já foi possível constatar uma queda no
número de mortes envolvendo policiais. “Do mês de novembro em diante, o número
de resistência seguida de morte, ou seja, de homicídios cometidos pela Polícia
Militar, caiu de 220, na média, para 35. E ficou nessa média durante muito
tempo”, disse ele, que se aposentou em 2010.
Fácil
trabalhar com violência
Já para
Guaracy Mingardi, especialista em Segurança Pública e membro do Fórum
Brasileiro de Segurança Pública, o excesso policial não acabou após o episódio
do Massacre do Carandiru. Passados 20 anos, ele acredita que ainda falta
controlar mais o trabalho da Polícia Militar. “Quando não se pisa no freio, a
polícia extrapola, porque é mais fácil trabalhar com violência”, disse ele.
Mingardi
critica a decisão da Secretaria de Segurança Pública de colocar no comando da
Rota policiais que são denunciados pelo massacre. Para ele, com isso, passa-se
à população uma “mensagem errada”.
O padre
Valdir Silveira, coordenador nacional da Pastoral Carcerária, tem a mesma
opinião: “Nosso manifesto coloca a indignação contra a premiação dos militares
que participaram do Massacre do Carandiru. Não só não houve julgamento [dos
responsáveis pelo massacre do Carandiru] como houve, pelo Estado, o fortalecimento
e a premiação [dos policiais] dizendo: ‘Eles agiram corretamente e agora
merecem destaque e apoio’”.
Ataques à
polícia
O númerode policiais militares assassinados no Estado de São Paulo também vem
crescendo e é praticamente 40% maior do que a quantidade de casos registrados
em todo o ano passado. Ao longo de 2011, foram mortos 48 policiais, enquanto
nos primeiros nove meses de 2012, até o início de setembro, foram 67
ocorrências.
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notícias de ataques àpolícia
Para
Mingardi, os números podem indicar que está ocorrendo um “revanchismo” em São
Paulo. “A polícia mata, os criminosos vão se vingar e a coisa vai crescendo.
Aí, quando se mata um policial, a polícia vai lá e mata mais. Inclusive porque
existe uma falha no nosso sistema. Quando não se resolve o caso do policial
morto e não se prende logo os criminosos, vai se criando uma ideia de
revanchismo na polícia.”
Outro lado
A Polícia
Militar de São Paulo não respondeu aos esclarecimentos solicitados pela
reportagem. Já a Secretaria de Segurança Pública (SSP) disse que a taxa de
letalidade vem caindo. “A taxa de letalidade caiu significativamente ao longo
da década. Ela era, em 2003, de uma morte por 132 prisões e apreensões
realizadas. Hoje, a taxa é uma morte por 290 prisões. A taxa de mortos pela
polícia em São Paulo é 1,1 em cada grupo de 100 mil habitantes”.
A
secretaria também destacou que a polícia é treinada para agir de acordo com a
lei e que, em casos de excessos ou crimes, os policiais são punidos.
“Importante lembrar que, neste ano, três policiais da Rota foram presos depois
de serem acusados de homicídio em uma ação. A ‘mensagem’, portanto, sempre foi
a de agir dentro da legalidade”, disse o órgão. Sobre a mudança no comando da
Rota, a secretaria informou que ela não foi provocada por motivos especiais e
ocorreu por “um remanejamento técnico e administrativo”.
Em
entrevista a jornalistas na última quinta-feira (27), o governador Geraldo
Alckmin falou que a substituição no comando da Rota foi técnica. “Essas
mudanças são normais e são decisões técnicas, da pasta e do comando [da PM]”. O
governador também enfatizou que o número de homicídios vem caindo no estado.“
"Todos
os indicadores de homicídio são crescentes no Brasil e em São Paulo há queda.
Somos um dos poucos estados na faixa de dez homicídios por 100 mil habitantes,
que é o que recomenda a Organização Mundial da Saúde”, disse ele.