Disponível em: http://www.redebrasilatual.com.br/temas/cidadania/2012/09/movimentos-querem-fim-da-logica-de-guerra-que-orienta-as-acoes-da-pm
Acesso em: 9 set. 2012
Cidadania
Movimentos
querem fim da 'lógica de guerra' que orienta as ações da PM
Publicado
em 07/09/2012, 13:00
Última
atualização às 13:21
São Paulo
– Para movimentos e organizações de direitos humanos de São Paulo,
desmilitarizar a Polícia Militar (PM), desvinculando-a do Exército e da ideia
de combate contra um inimigo interno, é um dos passos mais importantes na luta
contra a violência policial e estatal. Essa é uma das principais reivindicações
da Rede Dois de Outubro, que prepara uma série de atos para a semana de 2 de
outubro, que marca os 20 anos do massacre do Carandiru, ocorrido em 1992.
Naquele dia, 111 presos foram assassinados pela Tropa de Choque da PM. Até hoje
ninguém foi responsabilizado pelas mortes.
De acordo
com o parágrafo 6º do artigo 144 da Constituição Federal, as polícias militares
são forças auxiliares e reserva do Exército. Para os movimentos, essa definição
retrata um cenário que precisa ser discutido, modificado e superado. A história
republicana brasileira, que teve os militares como um de seus principais
agentes políticos, mais a recente ditadura (1964-1985), que trouxe a Doutrina
de Segurança Nacional, aparentemente nunca abandonada, estão entre os
apontamentos das organizações como componente histórico do comportamento
violento das polícias brasileiras.
Para Danilo
Dara, membro do movimento Mães de Maio, organização de familiares de vítimas da
violência policial e estatal, a proposta de desmilitarização busca um modelo de
polícia não repressiva, que seja cidadã e comunitária, procurando progressivamente
desmilitarizar e desarmar a sociedade como um todo. “Nós defendemos um modelo
de polícia que, em primeiro lugar, não seja baseado nessa concepção repressiva.
Que seja formada e controlada a partir das comunidades onde atuam, servindo aos
interesses de prevenção e auto-defesa única e exclusivamente dessas
comunidades”, diz.
Dara afirma
que não existe justificativa para a convivência da sociedade com uma polícia
pensada como um aparato repressivo para combater, prender e matar inimigos
internos. Em 29 de julho deste ano, as Mães de Maio começaram a recolher
assinaturas para uma petição pública exigindo a desmilitarização das polícias
militares de todo o Brasil.
O coronel
reformado da Polícia Militar de São Paulo André Vianna, ao discordar da proposta
de desmilitarização, aponta um imaginário ligado à memória da ditadura militar
como motivo de questionamento dos movimentos sociais. “O ideal é que se suprima
de vez a expressão 'militar' das instituições. Porque, senão, virão argumentos
como estes, que são equivocados. O policial que age hoje não tem inimigo. O que
ocorre é que muitas pessoas de organizações dessa natureza pensam que ainda
estão trabalhando com uma polícia dos anos 1960, 1970, que agiam
instrumentalizadas naquele momento, mas que hoje são outra instituição”, diz.
No entanto,
os documentos de duas entidades internacionais, publicados no primeiro semestre
deste ano, corroboram a preocupação das organizações de direitos humanos. O
relatório do Grupo de Trabalho sobre o Exame Periódico Universal (EPU) do
Brasil, do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU),
usou a definição “esquadrões da morte” para se referir à polícia brasileira e
sugeriu sua extinção. Já o relatório de direitos humanos da Anistia Internacional
referente a 2011 destacou que os agentes da lei continuam a praticar torturas e
execuções extrajudiciais no Brasil.
Para o
advogado da Pastoral Carcerária, Rodolfo Valente, a importância da
desmilitarização está sobretudo na questão de acabar com a situação de guerra
existente entre o Estado e as populações pobres. “É preciso desmantelar essa
lógica de guerra que orienta as ações da polícia, principalmente quando se
trata das populações de periferia”, diz. Para Valente, essa concepção, aliada à
falta de controle externo por parte da sociedade, contribui para os abusos no
cumprimento das funções policiais e, consequentemente, para a impunidade. “Os
crimes cometidos por esses agentes do Estado são investigados e julgados por
Tribunais Militares, que é uma justiça corporativa, sem o acompanhamento da
sociedade”, conclui.