Disponível em: http://www.proordem.com.br/noticias/5859/Campinas/2012/08/08/Artigo-Dr.-Nelson-Augusto-Bernardes-Policia-Para-quem
Acesso em: 09 ago 2012
Notícias PROORDEM
Artigo Dr.
Nelson Augusto Bernardes - "Polícia? Para quem?"
Campinas, 6
de Agosto de 2012
Assumi a
função de juiz corregedor da Polícia Civil faz cerca de dois meses. Por
determinação legal realizei visita correicional nos 21 distritos policiais de
Campinas. Fiquei estarrecido com o que vi. Em uma palavra, em princípio radical
porém verdadeira, é possível dizer sem medo de errar que a Polícia Civil do
Estado de São Paulo está praticamente parada. É uma estrutura amorfa, em franco
processo de sucateamento.
Já de plano
faço a ressalva de que certamente a situação atingiu tal ponto não foi por
culpa de seus integrantes, os homens e mulheres que trabalham em condições
algumas vezes sub-humanas, muitos demonstrando verdadeiro amor à nobre função
que exercem.
Os
distritos policiais não contam com quadro adequado de funcionários, não possuem
equipamentos mínimos adequados, não têm estrutura suficiente sequer para
cumprir as tarefas burocráticas naturais do serviço policial. As instalações
físicas de muitas das delegacias são semelhantes às construções de uma invasão.
As paredes
são sujas, a pintura velha, o reboco caindo, goteiras no telhado. Há em todos
os locais objetos de apreensão, por falta de espaço adequado, espalhados -
jogados mesmo - de forma desordenada, misturados a inquéritos policiais, provas
colhidas, maquinário velho e obsoleto.
Nos
distritos policiais há vários instrumentos apreendidos (as chamadas máquinas
caça-níquel, peças de veículos, pneus, até produtos alimentícios) ao relento,
sob sol e chuva, com insetos e ratos ao redor. Um horror. O receio de contágio
de doenças, como dengue, foi manifestado em diversas situações por policiais.
Muitos
deles confidenciaram-me a vergonha e desprezo sentidos por estarem trabalhando
naquele local esquecido pelas autoridades competentes.
Em um dos
distritos que visitei um funcionário, ao ser por mim cumprimentado, começou a
chorar. Perguntei a razão. Com muito medo de repreensão ele me disse, acanhado,
que aquilo era "uma máquina de fazer loucos, senhor juiz". Compreendi
a razão da fala. Não bastasse tudo isto, a remuneração está totalmente
defasada. Outras unidades da federação pagam até o dobro para policiais em
início de carreira. Investigar crimes? Não há como, declararam incontáveis
policiais.
Eu tinha
ciência sobre a grave situação da Polícia Civil, mas ainda não tinha visto tão
de perto, com meus próprios olhos, o caos atual. Neste passo, como forma de
tentar minimizar a situação caótica, é absolutamente necessário empregar todos
os esforços para instalação da 2ª Delegacia Seccional de Polícia na zona Oeste
da cidade.
Ora, o
Estado de São Paulo é o mais rico da federação. Sua Polícia Civil umas das mais
abandonadas e esquecidas, embora haja inúmeros excelentes policiais em seus
quadros. Paradoxalmente, a cobrança por segurança é frequente pela sociedade em
dias de escalada de violência.
O problema
não é de administração. É de governo. Enquanto não se quiser promover um real e
concreto resgate da Polícia Civil do Estado de São Paulo faremos de conta que
temos polícia. A população, como sempre, pagará um preço caro.
Nelson Augusto
Bernardes é juiz de Direito Titular da 3ª Vara Criminal de Campinas e juiz
corregedor da Polícia Civil